terça-feira, 5 de julho de 2011

Morreu, o nosso amor morreu

Enquanto todo mundo chamava ele de covarde, ela defendia: é a vida, depois passa, ele está mesmo numa fase esquisita. Ela olhava pra dentro e sabia que se enganava, mas insistia na ladainha de que tudo ia passar, que ele voltaria atrás, que ele se daria conta da mulher maravilhosa que iria perder, que tudo seria resolvido logo logo. Ele olhava cada vez menos pra ela, mesmo quando olhava, só sabia fazer aquela cara de não te amo mais que ela tanto odiava, aquele pedido de desculpas estampado na testa, eu desisto, eu desisto, não quero mais a gente. Ela olhava pra fora e era tudo muito claro, sabia que em algum momento ele deixaria de ser tão pouco homem, que um dia ele assumiria tudo, que não queria mais assumir nada, que se assustava com tantas coisas em comum, que se pelava de medo daquela certeza dela, que não sabia nada de futuro, nem de certezas, que era mesmo hora de ir. Ela sabia de tudo e esperava que estivesse errada, mesmo sabendo que nunca errava nessas horas, que mulher nenhuma erra nessas horas, o que a maioria faz é fingir que nem ela fingia, fingir que era compreensiva, fingir-se bem resolvida, indiferente até. Mas ele, ah, ele não fingia, quase esfregava a outra ou outras na cara dela, e era cada vez mais óbvio aquela escolha covarde, sim, covarde, de querer sempre a pessoa errada, com medo da felicidade óbvia. E um dia ela soube que era tarde, que ele era mesmo covarde demais, todo homem tem alguma coisa de covarde demais, e que seria ela mais uma vez quem teria que decidir pelos dois, ela que teria que pedir a morte deles, quase um suicídio, porque ele não teria a coragem necessária para apertar o gatilho.

E foi lá e matou. Ficou um restinho de sangue, mas ela saberia como limpar, novamente.

2 comentários:

  1. "(...)sabia que em algum momento ele deixaria de ser tão pouco homem, que um dia ele assumiria tudo, que não queria mais assumir nada(...)."

    Sensacional isso. Absolutamente sensacional.

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