quinta-feira, 11 de março de 2010

Quando o inverno chegar

Ela lia Saramago e não podia passar incólume. Em português, ou espanhol, que seja (que heresia, diriam alguns), Saramago é solidão, tristeza, melancolia, genialidade. O que fazia ela pensar na genialidade de ser triste, na beleza do fado. E ela que nunca havia pensado na sua própria tristeza descobriu o óbvio, do lado de cá do oceano, o português era uma língua triste.

A saudade não é triste, ela tentou explicar, mas poucos, e só os galegos, entenderam. Mas ela sabia que a ausência sim, essa era triste de verdade. Assim como o frio, a ausência do calor, deixa tudo meio branco, a lágrima branca (como diria o mestre) resolveu aparecer com a neve. Mas ela não se permitia, como nunca se permitiu, até o momento inevitável. Dessa vez não seria um temporal, porque não haveria sol arrebatador pra secar as calçadas. Dessa vez ela teria que aprender a lidar com a neve, com o inverno que não acabava.

Deve ser verdade, pensou ela, que o sol faz as pessoas mais felizes - ou alegres, que é a felicidade momentânea  ou imposta. Deve ser por isso, ela voltou a pensar, que a tristeza combinava tanto com dias nublados. E então ela descobriu porque por aquelas bandas o português tinha um quê de fado. E não de samba.