domingo, 6 de julho de 2008

Lá vem o sol

Ela não entendeu quando viu a foto no chão, nem quando a tal caneca caiu e quebrou, sem motivo algum. Quando procurou o e-mail na caixa de entrada, percebeu que todos os rastros tinham sido apagados. Ele não fazia mais parte de nada. Ela riu. Nem tinha percebido a ausência. Nem tinha sentido falta da lembrança. Nem saudade. Saudade do que não havia sido, convenhamos, não é pra se sentir mesmo. Ela então pensou como o mundo era estranho, lindamente estranho e surpreendente. Pensou em como tinha chorado, em como tinha doído. E ela riu de novo. Nem tinha percebido quando a dor parou de doer.

Ela tentou se lembrar quando ele se foi, não o dia da chuva, mas quando ele se foi de verdade. E ela não lembrava. Não lembrava de quanto tempo fazia, não nos dias contados, porque esses a gente marca na agenda e controla. Mas na euforia dos últimos meses, o temporal parecia ter sido há anos. Ela riu de novo das voltas que a vida dá. E se lembrou dele com carinho, como uma coisa que passou, sem muito marcar, sem ser muito bom ou muito ruim. Ele talvez nem tenha percebido que ela tinha ido. Mas ela sabia que tinha ido de vez.

E foi aí que ela entendeu. Lembrou que a chuva tinha sido forte, mas que era chuva de verão. Daquelas que vêm e vão, que alagam tudo, fazem poças, molham por dentro e por fora. Mas da mesma forma que fazem estragos, passam de uma vez. E ela entendeu que foi-se tudo com a chuva, dor, incertezas, inseguranças, sonhos frustrados. E nesse momento, como num estalo, ela lembrou que tinha tido outra chuva, daquelas boas, que fazem a gente ficar mais na cama, ouvindo os pingos caírem, sem querer sair do cobertor. E daquela chuva ela não teve medo. Esperou passar, se aqueceu, saiu do novo abrigo e comprou um guarda-chuva. E ele ainda está lá. Com ele à tiracolo, ela sabe, temporal nenhum vai assustar mais.