sexta-feira, 27 de maio de 2011

Não tenho nada pra dizer

Começou e apagou aquelas linhas tantas vezes que parecia até que não sabia o que dizer. Logo ela que inventava tantos diálogos, que escrevia tantas linhas, sérias ou de conversa fiada, logo ela que adorava a dissertação, a confrontação, a discussão. Logo ela que tinha tanto a dizer, não sabia o que dizer. Na verdade não é que não soubesse, ela sabia exatamente o que dizer a ele. E sabia exatamente o que ele deveria dizer a ela.

Mas, e se ele não dissesse? E se todas aquelas linhas não-ditas fossem mesmo não-ditas, se todas aquelas entrelinhas nunca tivessem passado de apenas isso, de entrelinhas, e se tudo não passasse de um devaneio, inventado, criado, repetido e repetido e repetido, até se tornar uma verdade mentirosa?

Ela não queria, ou não aguentaria, ou não suportaria saber a resposta errada. E preferia fingir que não tinha nada a dizer. E escrevia e apagava as linhas, e inventava tantos diálogos, tantas palavras, dissertava e confrontava e discutia. Postergando uma resposta que não saberia mais esperar, mas que continuava intocada. Adiando um não.

sábado, 7 de maio de 2011

É que eu preciso dizer que eu te amo

Porque eu sei que você nunca vai ler, posso escrever que ainda te amo escondido e sem você saber e que fantasiei tantas vezes que você também me ama escondido e sem eu saber. Que cada vez que o telefone toca eu penso que podia, pelo menos podia, ser você. Ou porque eu sei que você nunca vai ler, eu escrevo sobre o dia que eu te esperei ingenuamente, aquele dia que você desmarcou em cima da hora por causa de outra, pelas tantas vezes que você preferiu insistir que ela era mais interessante que eu. Posso escrever até que eu torço secretamente pra que ela te esqueça, pra que as outras todas te esqueçam, e que assim, quem sabe, você perceba que eu te amo escondida e sem você saber. Porque eu sei que você nunca vai ler, posso ser cruel e querer que nenhuma delas te responda nunca mais nenhuma mensagem, que todas elas percebam seu medo gigantesco de se comprometer, que todas descubram que você é um canalha perdido, do seu medo do mundo de gente grande e da sua falta de ambição. Que você não sabe dizer eu te amo, que você detesta aliança e que tem pavor de casamento e qualquer palavra que remeta a ele. Porque eu sei que você nunca vai ler, posso então contar que eu não aguento mais ouvir todas as suas histórias malsucedidas, nem lamentar todas as suas frustrações, nem satisfazer todas os seus egos e machismos, nem fingir que acho graça de todos os seus deboches. Só porque eu sei que você nunca vai ler, posso escrever que duvido que alguém te queira tanto apesar dos seus defeitos, que tenho certeza que nenhuma delas suportaria, até de bom grado, todos seus erros. Porque eu sei que você nunca vai ler, eu escrevo como se você fosse ler, disfarçando e aumentando cada linha pra você não entender que, na verdade, você é você, me escondendo até dentro de uma declaração pública, me enganando até dentro do meu próprio verso.

Porque, no fundo, eu sei que você vai ler.