segunda-feira, 5 de setembro de 2011

Roubo as estrelas lá do céu

Oi, hoje eu lembrei de você. Não que eu não pense todos os dias, mas hoje foi diferente: imaginei como seria se você ainda tivesse aqui. Ouvi aquela música que você cantava só pra me ver dançar - e eu adorava me mostrar pra você, aí deu uma vontade enorme de dançar mais uma vez pra você me olhar. Certamente você me achava mais desajeitada do que qualquer coisa, mas eu escuto até hoje essa música lembrando de você rindo da minha falta de ritmo. Lembro que você fazia de tudo pra me deixar menos tímida, e olha, acho que segui isso ao pé da letra. Ninguém mais diria que eu sou tímida, na verdade eu até falo pelos cotovelos, você nem iria me reconhecer mais. Claro que não sou tão popular quanto você, nem poderia, acabei ficando séria mais cedo. Não tenho aquele teu sorriso aberto e nem sou tão simpática quanto você queria, mas olha, a timidez foi embora. Também fiquei meio adulta antes da hora, uma coisa besta de não aceitar ajuda de ninguém, de não chorar na frente dos outros. Acho que tem um pouco teu aí, você foi embora cedo e eu passei a fingir que sou forte. Besteira minha, eu sei. Sei que você não aprovaria também meu sedentarismo, provavelmente eu continuaria bem mais saudável se você não tivesse indo embora, talvez até seria uma atleta profissional, como você sempre quis, já pensou? Mas não, virei sedentária, gosto mais da noite do que do dia, adoro um vinho em casa e fora de casa, virei fumante. Mas não se preocupe, tá tudo mais ou menos certo com a minha saúde, tirando umas recaídas esporádicas da minha garganta, você sabe que ela sempre foi meio problemática. Minha vida amorosa também vai bem, daquele jeito que era mais ou menos, não mudou muito. Continuo me apaixonando demais e pelas pessoas erradas, mas cada vez com menos frequência, deve ser coisa da idade. E continuo superando todos eles, todas as paixões exageradas e pelas pessoas erradas acabam no fim das contas. Talvez você até se divertisse com algumas histórias, sabe, você nunca teve muito ciúme, sempre defendeu esse amor livre e sincero que as pessoas tanto criticam e julgam; você não, nunca foi de julgar ninguém, e eu aprendi também muito isso com você. Aprendi a ver as pessoas com olhos bonitos, sabe, sem preconceitos. Acho que você ia gostar de me ver hoje, de ver como eu cresci sem você - ou apesar disso. Sim, você ia adorar saber que eu sei cozinhar, me viro muito bem com pouca coisa na geladeira, tá? Acho que você ia se orgulhar no fim das contas. Aprendi um monte de coisa, passei pra mesma faculdade que você, sei falar espanhol, me virei um ano sozinha em outro país. Como você queria, sem muita gente cuidando de mim, sabe?

Mãe, hoje eu pensei em como seria se você ainda tivesse aqui, e não chorei, juro. Até ri em alguns momentos. Talvez por causa daquela mania besta que eu te falei antes, de não me permitir chorar. Ou pra que você não achasse que tá tudo errado sem você.  Você deveria estar aqui, eu sei, mas tá tudo bem mesmo assim. Não se preocupe.